domingo, 13 de julho de 2014

A formação do Estado burguês no Brasil

Em oposição às vias clássicas de transição ao capitalismo, no Brasil o processo deu-se contemporizando com os elementos da velha ordem pré-capitalista
Segundo o conceito marxista de Estado, a função desse é garantir a dominação de uma classe sobre a outra. Conforme Engels, o Estado, seja ele burguês, feudal ou escravista, realiza sua dominação fundamentalmente através do controle da repressão (exército, tribunais, etc) e por meio de um sistema coletor de impostos. Cada tipo particular de Estado conduz de maneira específica essa dominação.

O capitalismo possui como aspecto que lhe é peculiar a troca da força de trabalho por um salário, que lhe é pago pelo dono do meio de produção. Essa relação mercantil é ilusória porque produz a aparência de uma troca entre iguais, o que, sabemos, não é verdade. O detentor do meio de produção, diante da disparidade material, encontra-se em condições privilegiadas para estabelecer a contratação da força de trabalho. A maneira como isso é possível resulta de uma estrutura jurídica-ideológica do Estado burguês. A exploração se manifesta, diferentemente dos modos de produção anteriores, no âmbito da economia (particularmente pelo sistema jurídico e ideológico) e não pela coerção física.

Ainda nesse sentido, o Estado burguês possui uma forma peculiar de organização do aparelho burocrático. Neste, há a presença dos setores dominados na composição estatal, como também, e por consequência disso, há uma distinção entre o público e o privado; o Estado não é uma propriedade do príncipe. Sua direção política também é produto do posicionamento das frações da burguesia e aliados. A fração dominante, que articula as demais em torno do seu projeto, é chamada de hegemônica. Em momentos de crise aguda, é possível que a burocracia de Estado assuma uma autonomia frente às classes em luta, fenômeno chamado por Marx de Bonapartismo.

A nossa transição burguesa é longa e contempla várias etapas. Diversos autores defendem que os marcos da mudança política que permitiram a transformação econômica ocorreram no final do século XIX, com a abolição da escravidão, a proclamação da República e com a Constituição de 1891. Nesse momento, diversas transformações se produziram no âmbito da superestrutura: a separação da Igreja e do Estado (laicização), extinção do Poder Moderador; eleições diretas para presidente, inclusive das Províncias; fim do Senado vitalício e da Guarda Nacional; e, dentre outros, uma maior autonomia no âmbito dos estados.

Esse processo vai se alargar, manifestando-se um consistente potencial econômico e industrial do país, com a Revolução de 30, que é resultado da insatisfação da classe média, em especial dos militares, e com a crise do café, produto que garantia uma certa pacificação no âmbito das elites dominantes. Apesar das mudanças advindas com a transformação política, inclusive abrindo o caminho para que o setor industrial assuma a hegemonia enquanto fração de classe, nossas mudanças se expressaram através do que Gramsci e Lenin classificaram, respectivamente, como Revolução Passiva e Via Prussiana, conservando elementos da velha sociedade em sintonia com o novo. Dessa maneira, parte da revolução burguesa não se realizou, como, por exemplo, a transformação da estrutura agrária nacional, fazendo dessa revolução uma revolução ainda incompleta.

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